Quando a violência é normalizada e não há mecanismos locais de acolhimento, a omissão institucional converte-se em mais uma forma de violência.
A cada 25 de novembro lembramos que a violência contra a mulher não é um “caso isolado” ou um acidente de convivência. É uma rotina silenciosa que atravessa casas, bairros e gerações inteiras. A invisibilidade não apenas encobre o problema: ela o normaliza. Quando escolhemos não ver, não ouvir e não intervir, não estamos sendo prudentes; estamos colaborando com quem agride e abandonando quem sofre.
Não precisamos viver em grandes capitais para entender as consequências desse silêncio. Nas cidades pequenas e médias, a violência é ainda mais abafada: todo mundo se conhece, os laços familiares se cruzam, a opinião pública pesa. A vítima tem medo de denunciar porque sabe que a informação vai circular antes mesmo de chegar à autoridade competente. O agressor, por outro lado, sente-se protegido pela proximidade social: “não vai dar em nada”, “todos sabem que eu sou um bom homem”, “foi só uma discussão” “não, não tive a intenção, vocês me conhecem”. Esse ambiente é um terreno fértil para a repetição e o agravamento da violência.
Nesse contexto, a falta de serviços especializados — delegacias da mulher, centros de referência, equipes multidisciplinares — intensifica a sensação de abandono. A mulher percebe que pedir ajuda pode significar expor-se a julgamentos morais, ao descrédito e à revitimização. É aí que a invisibilidade deixa de ser omissão e se torna violência institucional: quando o sistema não garante proteção, ele reforça a vulnerabilidade.
Mas há caminhos concretos para romper esse ciclo, mesmo onde a estrutura pública é limitada. A revitalização comunitária não é só conceito: ela começa com redes de confiança. Unidade básica de saúde, agentes comunitários, escolas, associações religiosas e comerciais — todos podem ser pontos de acolhimento, orientação e encaminhamento. Não substituem a política pública, mas impedem que a mulher fique sozinha, criam rede de apoio.
Precisa-se também de pactos locais. Um município pode criar protocolos simples: quem atende primeiro? Qual telefone dispara os serviços? Como preservar o sigilo? Não é necessário começar com um prédio novo ou verba milionária: começa-se com organização e vontade política. A cidade que entende que proteger mulheres é proteger famílias, economia e dignidade, dá um passo à frente.
O 25 de novembro não existe para homenagens simbólicas. Existe para lembrar que a violência contra a mulher é uma violação de direitos humanos e, sobretudo, um problema público. Quando a sociedade local decide enxergar, a lógica da impunidade quebra. A pergunta que fica para nós, cidadãos comuns, é direta: quantas histórias ainda vamos aceitar como “normais” antes de perceber que o silêncio também é uma forma de violência?
25 de novembro: Dia Internacional de Combate à Violência contra a Mulher
Quando a violência é normalizada e não há mecanismos locais de acolhimento, a omissão institucional converte-se em mais uma forma de violência.
A cada 25 de novembro lembramos que a violência contra a mulher não é um “caso isolado” ou um acidente de convivência. É uma rotina silenciosa que atravessa casas, bairros e gerações inteiras. A invisibilidade não apenas encobre o problema: ela o normaliza. Quando escolhemos não ver, não ouvir e não intervir, não estamos sendo prudentes; estamos colaborando com quem agride e abandonando quem sofre.
Não precisamos viver em grandes capitais para entender as consequências desse silêncio. Nas cidades pequenas e médias, a violência é ainda mais abafada: todo mundo se conhece, os laços familiares se cruzam, a opinião pública pesa. A vítima tem medo de denunciar porque sabe que a informação vai circular antes mesmo de chegar à autoridade competente. O agressor, por outro lado, sente-se protegido pela proximidade social: “não vai dar em nada”, “todos sabem que eu sou um bom homem”, “foi só uma discussão” “não, não tive a intenção, vocês me conhecem”. Esse ambiente é um terreno fértil para a repetição e o agravamento da violência.
Nesse contexto, a falta de serviços especializados — delegacias da mulher, centros de referência, equipes multidisciplinares — intensifica a sensação de abandono. A mulher percebe que pedir ajuda pode significar expor-se a julgamentos morais, ao descrédito e à revitimização. É aí que a invisibilidade deixa de ser omissão e se torna violência institucional: quando o sistema não garante proteção, ele reforça a vulnerabilidade.
Mas há caminhos concretos para romper esse ciclo, mesmo onde a estrutura pública é limitada. A revitalização comunitária não é só conceito: ela começa com redes de confiança. Unidade básica de saúde, agentes comunitários, escolas, associações religiosas e comerciais — todos podem ser pontos de acolhimento, orientação e encaminhamento. Não substituem a política pública, mas impedem que a mulher fique sozinha, criam rede de apoio.
Precisa-se também de pactos locais. Um município pode criar protocolos simples: quem atende primeiro? Qual telefone dispara os serviços? Como preservar o sigilo? Não é necessário começar com um prédio novo ou verba milionária: começa-se com organização e vontade política. A cidade que entende que proteger mulheres é proteger famílias, economia e dignidade, dá um passo à frente.
O 25 de novembro não existe para homenagens simbólicas. Existe para lembrar que a violência contra a mulher é uma violação de direitos humanos e, sobretudo, um problema público. Quando a sociedade local decide enxergar, a lógica da impunidade quebra. A pergunta que fica para nós, cidadãos comuns, é direta: quantas histórias ainda vamos aceitar como “normais” antes de perceber que o silêncio também é uma forma de violência?
Dra. Débora Garcia Duarte
Advogada. Mestre em Direito (UENP - Jacarezinho). Professora universitária e coordenadora da FIT. Autora da obra Reveng Porn: a perpetuação da violência contra a mulher na internet e o poder punitivo. Pesquisadora na área de direitos das mulheres e doutoranda pela FCA - UNESP Botucatu.